03 janeiro, 2006


Um lugar vazio...
Estou triste. Acabei de saber que o jornalista Carlos Cáceres Monteiro nos deixou esta madrugada. Tive a sorte de o conhecer há quase um ano. E nunca me hei-de esquecer daquele senhor. Nunca. Por mais tempo que passe. Precisava de o entrevistar para a minha tese, que era sobre repórteres de guerra. Mandei-lhe uma carta sem esperança de obter resposta, confesso. Afinal era o director da revista e do grupo, que certamente tinha uma agenda muito ocupada. Uns dias mais tarde fui surpreendida por um telefonema da sua secretária para marcarmos a entrevista. Lembro-me de que no dia em que ia conversar com aquele grande repórter estava um bocadinho assustada. Afinal, ia entrevistar o "monstro" do jornalismo português. Entrei no luminoso edifício da Edimpresa e fiquei à espera, sentada num sofá, com o meu caderninho na mão. A secretária avisou que o Carlos ia chegar um pouco atrasado porque estava numa reunião. Passados alguns minutos lá me disseram para subir. Entrei no elevador e senti-me uma formiguinha. Subi ao primeiro andar e atravessei uma sala. A secretária apresentou-se. Era muito simpática. E levou-me para uma outra sala, onde estava o Cáceres Monteiro. Lembro-me dele como se fosse hoje. Vestia uma camisa de xadrez em tons de azul e creme e trazia umas calças bege de bombazine, a condizer. Naquele dia tinha um penso rápido no rosto. Deu-me dois beijinhos e pediu desculpa pelo atraso. Despiu o blazer e toda a formalidade. Tinha uma postura serena e uma voz doce. Comecei a entrevista, que rapidamente se tornou uma conversa. É incrível a dimensão humana que aquele senhor tinha. E a humildade. Foi talvez o jornalista português que cobriu mais conflitos, mais crises internacionais. Provavelmente o jornalista português com mais experiência mas com uma humildade impressionante. Encarava cada trabalho como uma missão, sem marcas de heroísmo. Foi isso que mais me tocou nele. A sua simplicidade. Conversámos durante algumas horas, que passaram a correr. Porque cada pergunta que lhe fazia ele contava-me uma história. Era um grande contador de histórias. Absorvia tudo. Falou-me da sua passagem pelas guerrilhas de El Salvador, pelas duas Guerras do Golfo, por Timor, pela Indonésia, por Israel, por Angola, a sua presença nas eleições da Rodésia, nos jogos Olímpicos do México... Sempre com um entusiasmo contagiante. Para além do jornalismo Cáceres Monteiro tinha outra paixão: as viagens. De todos os jornalistas que tinha entrevistado para a tese foi aquele que mais me marcou. Depois da entrevista despediu-se de mim, muito amável. Deu-me o seu número de telefone pessoal (para o caso de eu precisar de mais alguma coisa) e disse-me que um dia daqueles podíamos almoçar. Saí daquela sala com um sorriso nos lábios. A admiração que tinha por aquele grande senhor disparou naquelas horas. Fiquei de lhe enviar o trabalho mas como a nota ainda não saiu não fui a tempo... Este Natal quando percorria a minha lista de contactos do telemóvel para enviar mensagens parei no número de telefone dele. Estive quase para lhe enviar os votos de um feliz Natal mas pensei que provavelmente ele não se iria lembrar de mim. Quem me dera ter enviado...
Fico com a recordação de um senhor inteligente, simples, simpático, que um dia me disse que "nós também somos aquilo que vivemos". Portanto, um grande jornalista. Um grande homem.

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